entrevista
4.Outubro.2014



Suely Dias, coordenadora do Grupo Se Toque

“Quando ouvi o diagnostico, achava que ia morrer”
sueli dias conta a coordenadora do Grupo Se Toque, Suely Dias, explicando que a maioria das mulheres sente o mesmo, por isso o grupo atua principalmente no apoio psicológico. Ela conversou com o jornalista Marcel Leal no programa Mesa pra 2, da rádio Morena FM, sobre o Outubro Rosa.
      Suely comenta sobre a importância da família durante o tratamento, as angústias, a rejeição de alguns maridos e o choque para os parentes. “Em alguns casos a mulher doente era quem resolvia os problemas da família, era o bombeiro”.

Marcel - Como surgiu essa campanha?
       Suely – Ela surgiu nos Estados Unidos. Em Itabuna, iniciamos com um lacinho de fita cor de rosa, distribuído nos ônibus, onde explicávamos o significado. Muita gente não queria nem receber. Conseguimos ampliar as ações a partir da criação do Grupo se Toque em 2005. Ele foi criado por um grupo de mulheres que passaram pela quimioterapia. A mulher precisava conversar e trocar ideias sobre seus medos com alguém que não seja da família.

Inicialmente o grupo tinha mais reuniões ou palestras?
       Começou com palestras e hoje temos reuniões semanais e atividades de orientação para um público de menor acesso. Nosso propósito é justamente levar informação a quem tem mais dificuldade de chegar a ela. Trabalhamos com pessoas saudáveis visando a prevenção e com os doentes fazendo suporte emocional.

O que pesa mais quando se descobre que está com o câncer?
       Muitas coisas e uma delas é ter na mente que o câncer é uma sentença de morte. Quando eu recebi o diagnóstico, tinha convicção de que iria morrer. Vinha de uma trajetória de pessoas que tinham passado por experiência negativa. Eu não conhecia casos de sucesso.
      Hoje podemos ter certeza que existe o diagnóstico e a cura. Depois a pessoa repensa muita coisa, não quer mais perder tempo com bobagens, e muitas vezes joga fora preconceitos, valores que não levam a lugar nenhum.

Quais sãos os maiores medos de quem tem a doença, além da morte?
       Dr. Urandir Riela costuma dizer que nenhum médico é Deus. Não se pode dizer quando se vai morrer. Cabe ao médico fazer tudo o que for possível, pois cada pessoa tem uma forma de reagir. Algumas mulheres têm medo de ficar careca. Havia todo um preconceito e o medo da retirada da mama.
      No Grupo Se Toque, já houve casos em que uma mulher retirou a mama e o companheiro a abandonou. Se o marido não é uma pessoa segura, ele abandona, não porque não ame, mas porque tem medo.
      Um companheiro presente é importante, alguns vão junto com a mulher para o tratamento. Outros nem aparecem e num câncer de mama isso é essencial, porque a mulher mutilada se sente feia.

Tem casos em que a pessoa tem mais medo do tratamento do que da doença?
       Tem sim. Se uma paciente passou mal durante a quimioterapia, ela vai dar para outras pessoas a pior imagem possível. Existem casos em que elas passam um período em bom estado, sem grandes transtornos. Cada pessoa reage de uma forma diferente.

O que é mais pesado, quimio ou radioterapia?
       Há diferença. A quimioterapia tem um efeito mais pesado. Em algumas pessoas ela tem efeitos colaterais grandes, vai depender do estado físico que a pessoa já tinha antes e da alimentação. Na radioterapia os efeitos colaterais são bem menores.
      Mas é na radioterapia que o cabelo cai. No grupo temos mulheres que fazem coleção de lenços, outras ostentam sua caraquinha, o que era impensado antes. Hoje temos muitos movimentos e blogs que falam da beleza nessa fase.

O que mais aparece nas rodas de conversa do grupo?
       No primeiro momento aparecem dicas de como disfarçar a queda do cabelo, os truques de alimentação. O diferencial é trabalhar o emocional. Nós temos voluntários psicólogos para trabalhar o emocional de diversas formas. Temos casos em que a família coilabora, em outros, é mais distante.

A doença em geral tem esse efeito...
       Sim. No caso das crianças com câncer, na hora do sofrimento ela chora, grita, mas passando aquele momento vai brincar. Já o adulto tem uma história de vida, às vezes de dor, de sofrimento e o câncer vai ser o fermento que dará mais amplitude. Tudo o que ela não resolveu nos anos anteriores, quando se descobre com o câncer joga sobre seus ombros.

O Se Toque tem trabalhado também com crianças?
       Não, só com o adulto e a gente não dá conta. Para as crianças tem o GACC, que faz um trabalho excelente. Nós trabalhamos com quem não está internado. Temos alguns pacientes que apadrinhamos. São pessoas carentes que acompanhamos e, dentro das condições, suprimos as necessidades.
      Já tivemos pacientes com contas atrasadas de água, luz e outras dividas. Trabalhamos para sanear essas contas. Não se pode cuidar de um paciente sem cuidar da família também. Houve um paciente que não tinha possibilidade nem do tratamento. Aí vem outras questões, como com quem ficam os filhos.

Quando o governo federal restringiu as mamografias, complicou o tratamento?
       A Sociedade Brasileira de Mastologia recomenda que a mamografia seja feita a partir dos 40 anos, anualmente. Em novembro do ano passado o Ministério da Saúde editou portaria de que só vai pagar mamografia para a faixa etária de 50 a 59 anos e a cada dois nos. A mulher fica sem prevenção. É preciso o exame sim, e não apenas quando estiver com algum sintoma.

Esse aumento para cada dois anos complica o tratamento?
       Sem duvida. O tratamento é mais demorado, mais sofrimento e, se o tumor for agressivo, pode ter crescido bastante. Ainda não se conseguiu reverter essa portaria.
      Temos a Federação Brasileira de Mama lutando, houve muitas manifestações e até deputados que apóiam a luta contra o câncer de mama não conseguiram manter a mamografia preventiva. Ainda existem as questões locais. Temos mastologistas disponíveis, mas que precisam de espaço e meios para trabalhar.
      Antes de se chegar a um diagnostico de câncer, é preciso uma serie de passos. Ela passa pela unidade de base no bairro, é encaminhadas para o Ceprom, há a investigação e o diagnóstico.
      O Cepron funcionava em um bom prédio e hoje está improvisado no antigo Sesp. Tudo o que essa unidade fazia em três andares, faz numa sala improvisado. Está prejudicando nosso trabalho.

Biópsias e exames laboratoriais são feitos em Itabuna?
       Não. Colhe-se o material e envia para Salvador. Por questão de espaço, o Cepron não está realizando nem o básico. Não se pode fazer uma biopsia aqui por falta de agulhas apropriadas e isso complica o tratamento e a recuperação. É lamentável. Temos muitos desafios. A Secretaria de Saúde de Itabuna está procurando outro espaço para o Cepron.

Todos os tipos de tratamento podem ser feita em Itabuna?
       Sim, desde o tratamento à cirurgia, menos a reconstrução. O Sistema Único de Saúde tem um cirurgião plástico mas não compra a prótese. Isso é o sonho das mulheres aqui em Itabuna.
      Tudo tem sido demorado, do exame ao diagnóstico, programado para 60 dias, que não é feito. Existe um processo que precisa ser respeitado. Alguns médicos sonham um dia em ter um hospital em Itabuna só de oncologia. É um sonho, assim como uma UTI oncológica.

Tem pessoas que se adaptam mais fácil?
       Tem sim. Em todos os tratamentos seja na radio ou quimioterapia, temos profissionais de nutrição, psicólogos e outros que orientam os pacientes. Um paciente fumante, por exemplo, sabe que não pode fumar, tem que manter boa alimentação, comer de 3 em 3 horas.
      Apesar da orientação, muitos teimam e passam mal. Nessa campanha, estamos enfocando muito a alimentação saudável e a atividade física. Hoje se usa muito o que já está pronto no mercado e tudo tem conservantes. A gente até come o industrializado, mas é aconselhável comer o mínimo.

A quimioterapia é feita no hospital ou em casa?
       A quimio é um tratamento através da veia, na Unidade de Quimioterapia do Hospital. No caso do câncer de mama, o tratamento é de 21 dias para combater o tumor. Quem tem mais debilidade pode passar uma fase mais ruim.

E o Outubro Rosa, como ganhou esse formato que tem hoje?
       Foi no final da década de 90, nos EUA. O rosa já estava instituído como a cor da luta contra o câncer de mama. As ações mais impactantes foram a corrida do câncer de mama e a iluminação de prédios e monumentos na cor rosa.
      Aqui no Brasil chegou por volta de 2008 em São Paulo e no Rio Grande do Sul. Em Itabuna, o grupo está trabalhando com diversos parceiros, empresas, TVs, 7ª Dires e colaboradores. Foi tudo de bom, inclusive o Camarim do Outubro Rosa.

Como funcionou esse camarim?
       Fechamos uma parceria com a Escola Profissionalizante para atendimento às mulheres com serviços de cabelo, unhas e sobrancelhas, que também caem.
      Conseguimos uma empresa que trabalha com produtos de beleza, que fez uma maquiagem linda durante o Camarim Rosa. As mulheres que fazem quimioterapia comentam enquanto estão sendo maquiadas e as maquiadoras ficam mudas, apenas ouvindo. Muitas se emocionam.

No Outubro Rosa tem palestras de especialistas?
       Sim, temos muitos, como mastologistas, nutricionistas, psicólogos. Nas rodas de conversa, tiramos dúvidas e não abordamos apenas o câncer de mama. No ano passado fomos a uma empresa para falar do câncer de mama e a platéia era formada por homens. Aproveitamos para falar sobre o câncer de próstata, o exame, a prevenção e o tratamento.

Quais a próximas atrações do Outubro Rosa?
       Temos atividades todos os dias. Nas quartas-feiras temos roda de conversa com um mastologista na FTC. Teremos palestras nos bairros, na Oconsul, e neste domingo faremos palestra no presídio. Na terça-feira estaremos em Nova Ferrada e outros bairros. E estamos buscando outras ações para fechar o mês.


 
compre fazenda
Anuncie aqui: (73) 3043-8941


Copyright©1996-2014 A Região Editora Ltda, Praça Manoel Leal (adami), 34, 45600-023, Itabuna, BA, Brasil | Reprodução permitida desde que sem mudanças e citada a fonte.